quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Dando continuidade ao texto anterior...


A Linguagem dos Símbolos
No início era o caos...
No vazio a substância escura aglutina-se em um infinito ponto, em um instante-tempo o processo para, a energia concentrada naquele ponto emerge em uma grande explosão – o Big Bang.
Naquele momento o Um se transforma em Três: o som, a luz e o movimento. Irrompe a vida, o vazio está agora limitado, surge o espaço, a forma, o sagrado torna-se plural.
            No instante em que um deus manifesta a vontade de dar nascença a si próprio ou ao outro deus, de fazer surgir o céu e a terra, ou o homem, emite um som. Expira, suspira, fala, canta, grita, ulula, expectora, vomita, troveja ou toca um instrumento musical. (Schneider, apud BEAINI, 1995, pág. 23)
O som, o conhecimento e o reconhecimento da natureza, instauram a manifestação da vida, a criação do nome, os gestos que recuperam a origem, fruto da experiência do homem com a natureza que o cerca.
Mircea Eliade define esta experiência de hierofania como algo de sagrado que se nos revela. (ELIADE, 2001, pág. 14-5), afirma que os mitos, enquanto uma expressão do sagrado, narram uma história, que remete àquilo que os deuses, os seres divinos fizeram no começo dos tempos. Assim, os mitos são narrativos que resgatam o início da existência de todas as coisas, isto é, revelam como tudo passou a existir. (ELIADE, 2001, p. 82-5)
Para Jung essas narrativas representam todo o material arquetípico que se faz presente nas relações coletivas. Os arquétipos são:
 Os elementos estruturais da psique inconsciente, formadores de mito... São certas estruturas das imagens primordiais da fantasia inconsciente coletiva e categorias do pensamento simbólico, que organizam as representações originadas de fora (MIELIETINSKI, 1987, p. 69).
Os mitos, para Jung, conduzem às fontes originárias, presentes no inconsciente coletivo. Os arquétipos possuem duas representações: primeiramente, são imagens, personagens, papéis a serem desempenhados; e em segundo lugar eles representam o processo de individuação, fazendo-se representar também na consciência individual. (JUNG, 2008, p.17)
Surge assim o símbolo, como o modo ou meio de significar o “ente” ou “algo” enquanto finito.
O termo símbolo, com origem no grego símbolon, ou sinbolê designa um elemento representativo que “... está em lugar de algo” (SANTOS, 2007, p.8), e que pode ser um objeto como um conceito ou idéia.
O símbolo é um elemento essencial no processo de comunicação, está disseminado pelo quotidiano e pelas mais variadas vertentes do saber humano. Usamos os símbolos para transmitir o intransmissível, como por exemplo, a natureza, os acontecimentos cósmicos, a vontade, o desejo, o sentimento e a forma de objetivá-los.
O símbolo surge na Arte, através das harmonias, cores e sons que os artistas ao observar a natureza sentem e expressam em suas criações.
A Filosofia interpreta seus códigos e abstrai da forma para chegar à essência.
A Ciência simboliza todos estes processos, compartimentando-os para interpretá-los e demonstrar as leis que regem os acontecimentos cósmicos.
Na religião, podemos ver os símbolos nos ritos e liturgias, através das palavras que determinam nos gestos que atraem, e nos sinais que fixam. Podemos ainda observá-los nas vestimentas, nos objetos, nas danças, nos cânticos e nos espaços destinados ao sagrado.
Os símbolos podem possuir uma série de características que Ferreira dos Santos (SANTOS, 2007, p.10-1) define assim:
a)    Polissignificabilidade – a polissignificabilidade dos símbolos consiste na aptidão a se referirem a mais de um simbolizado. Um símbolo pode ser deste ou daquele referido. A cruz, por exemplo, é símbolo das quatro estações do ano, dos quatro pontos cardiais, das quatro idades do homem, de Cristo, da morte, etc.
b)    Polissimbolizabilidade – Um simbolizado pode ser referido por vários símbolos. A solidão, como simbolizado pode ser significada por um rochedo isolado em alto mar, um pequeno barco na imensidade de um lago, uma águia no topo de uma montanha, uma árvore numa planície vazia.
c)     Gradatividade – O símbolo tem uma escalaridade de significabilidade a um simbolizado, pois ele pode ser melhor símbolo deste simbolizado do que daquele;
d)    Fusionabilidade – Capacidade de o símbolo fundir-se com o simbolizado ante a apreciação simbólica, como sucede frequentemente na parte exotérica das religiões, em que os símbolos terminam por serem os próprios simbolizados;
e)    Singularidade – Característica rara de alguns símbolos que conseguem alcançar uma significabilidade única, de um único simbolizado, como o Ser Supremo, como símbolo de Deus. Nestes casos dá-se até a fusionabilidade;
f)     Substituibilidade – os símbolos que se referem também a um mesmo simbolizado, entre muitos outros diversos a que se podem referir, permite a sua mútua substituição;
g)    Universalidade – Todas as coisas são símbolos da ordem a que pertencem. Todos os fatos são símbolos do conceito, que é um esquema abstrato. Dessa forma o símbolo é universal.

Segundo o pensamento junguiano, os símbolos constituíram a psique humana tanta coletiva como individualmente. (JUNG, 2002, p. 53)
Jung, fala sobre o conceito de arquétipo assim:
“... constitui um correlato indispensável da idéia do inconsciente coletivo, indica a existência de determinadas formas na psique, que estão presentes em todo o tempo e em todo lugar”. (JUNG, 2002, p. 53)
Nas pesquisas mitológicas denomina – as de “motivos’ ou “temas”,
 “... na psicologia dos primitivos elas correspondem aos conceitos das représentations colectives  de LEVY-BRUHL. (JUNG, 2002, p. 53)
Para as religiões comparadas, são definidas com “categorias da imaginação” por HUBERT e MAUSS. (JUNG, 2002, p. 53)
ADOLF BASTIAN designou-as como “pensamentos elementares” ou “primordiais”. (JUNG, 2002, p. 53)
JUNG define o inconsciente coletivo como:
... algo que não se desenvolve individualmente, mas é herdado. Consiste de formas preexistentes, arquétipos, que secundariamente podem tornar-se conscientes, conferindo uma forma definida aos conteúdos da consciência. (JUNG, 2002, p.54)
Define ainda o Inconsciente Coletivo com uma parte da psique que pode distinguir-se de um inconsciente pessoal pelo fato de que não deve sua existência à experiência pessoal e o Inconsciente Individual como aquele que é constituído essencialmente de conteúdos que já foram conscientes e, no entanto, desapareceram da consciência por terem sido esquecidos ou reprimidos. (JUNG, 2002, pág.54).
Alguns símbolos existem em todas as culturas e em todos os tempos. Exemplo:
. Símbolos Celestes: sustentam os ritos de ascensão, de escalada, de iniciação, de realeza, etc., os mitos (a Árvore Cósmica, a Montanha Cósmica, a cadeia de flechas que liga o Céu à Terra).
. Simbolismo Aquático: As Águas existem antes da Terra. As águas representam a soma universal das virtudes, precedem toda a forma e sustentam toda a criação. A imersão na água simboliza a regressão ao pré-formal, a emersão na água simboliza a manifestação formal. Morte e Renascimento.  O simples contato com a água comporta uma regeneração, uma purificação. Ex: dilúvio, submersão periódica (Atlântida), morte iniciática (batismo). Portanto, o dilúvio é comparável ao batismo, o velório ao nascimento. Portanto a função da água é sempre o mesmo, independente da religião onde ela surja: desintegrar, abolir as formas, lavar os pecados, purificar, e enfim, regenerar.
. Terra Mater: Ser depositado na terra, ao nascer ou ao morrer dá uma idéia de interdependência entre a Raça e a Terra. Está presente tanto na Europa, ainda hoje, como na África, China e Oriente Médio, América.
. A mulher, a terra e a fecundidade: A mulher, como a terra, dá a luz e é fecunda. Foi a mulher que descobriu a agricultura, e da terra tirou o sustento do clã. Até pouco tempo atrás, era a mulher que plantava e colhia. E ainda é assim entre índios, e africanos. Ao homem cabia a caça e a proteção do clã. O Deus-Céu e a Terra-Mãe servem de exemplo para os casamentos humanos, que procuram imitar essa hierogamia, justificando a estrutura cósmica do ritual conjugal e do comportamento conjugal. Segundo Mircéia Eliade, a orgia agrária é uma regressão à Noite Cósmica, ao pré-formal, às “Águas”, a fim de assegurar a regeneração total da Vida e, por conseqüência, a fertilidade da Terra e a opulência das colheitas. (ELIADE, 2001, pág. 28)
. Árvore Cósmica: A capacidade infinita do Cosmos em se regenerar é comparável à Árvore gigante. Simboliza também a Vida, a Juventude, a Imortalidade, e a Sabedoria. Este símbolo está presente na cultura germânica (Yggdrasil), na Ásia (Bhoudhi), no Antigo Testamento (sarça ardente), na Mesopotâmia, na Índia (arbusto ashvatha) e no Irã. Na cultura africana, a árvore representada pelo Iroko, significa o centro do mundo, onde as divindades faziam o giro em torno dele; era ao pé de uma árvore que se enterrava o cordão umbilical (a sua individualidade), passando aí a simbolizar a força física e espiritual daquele indivíduo. No contexto geral, a árvore simboliza o Axis Mundi, conexão entre a Terra e o Céu (mundo espiritual).
. Montanha: é um símbolo do Universo. Se no meio do mar, simboliza as  Ilhas dos Bem-Aventurados (Paraíso dos taoístas). Geralmente são ricas em grutas. Estas são retiros secretos, morada dos Imortais Taoístas e local das Iniciações.
Remonta à idéia de Monte e Lago primordiais.
. Pedras: Significando Poder, Firmeza, a Permanência, a Irredutibilidade e o absoluto do Ser. Consideradas morada de espíritos ou deuses. Eram utilizadas como lápides, marcos ou objetos de veneração religiosa. Sempre foram importantes em todas as culturas, desde o Judaísmo (p.ex., Jacó), Celtas (Bretanha e Stonehenge), nos jardins do Zen-Budismo, e nos cultos africanos.
. Lua: Ritmos lunares. Nascimento, morte e ressurreição. Consegue explicar ao homem fatos que poderiam ser desconexos. Ex: nascimento, o porvir, a morte, a ressurreição, as Águas, as plantas, a mulher, a fecundidade, a imortalidade, as trevas cósmicas, a vida pré-natal, a existência além-túmulo seguida de um renascimento, a tecelagem (fio da vida), o destino, a temporalidade, a morte. Idéia de ciclo, dualismo, polaridade, oposição, conflito, reconciliação dos contrários.  A lua reconcilia o homem com a Morte.
. Sol: Embora em constante movimento, ele é imutável. Autonomia, Soberania, e Inteligência. Ex: Apolo, Júpiter, Osíris, Hórus, Adônis.
            Analisaremos agora os símbolos concernentes à cada raça raiz que formou o povo brasileiro.
. Aves: O pássaro sempre esteve presente em todos os cultos religiosos primitivos e ainda hoje permanece como símbolo do Espírito Santo para os cristãos, está presente no sincretismo como a Congada e a Folia de Reis, nos estandartes e fitas usadas. Na África, a pomba é o símbolo do Espírito, ligado aos cultos das Yamis; a galinha d’angola simboliza a criação e da iniciação.  Entre os Xamãs, o pássaro é símbolo do Espírito.
. Animais: Cavernas e rochas com desenhos de animais sempre tiveram uma conotação religiosa, sendo investido de grande temor e respeito pela população local.  Certamente serviam de local para ritos mágicos de caça, e fertilidade. O totem animal simboliza o próprio animal, sua força, sua agilidade e seu poder.
. Cruz: está presente na história de muitos povos, entre eles egípcio, celta, persa, romanos, etc. É a união de dois eixos opostos, vertical e horizontal, em 90º, separando o mundo em quatro quadrantes, determinando os pontos cardiais (norte, sul, leste e oeste). Os eixos também simbolizam o sol (vertical) e lua (horizontal)
. Arco e Flecha: símbolo do Destino. O Arco representa firmeza, vontade e determinação. A Flecha simboliza a libertação, o direcionamento para o Alto, a Luz projetada, a Imortalidade. Os dois juntos representam o Plano Espiritual e o Físico, o consciente e o inconsciente.
. Cobra: Na Grécia era relacionada com a Sabedoria e o Conhecimento. Era componente do Bastão de Esculápio. Símbolo do Poder, e também símbolo fálico. Na Índia, era o símbolo do Kundalini e dos deuses Nagas. O Ouroboros é um símbolo da Alquimia, do Hermetismo e do Ocultismo, e simboliza a Eternidade, o Eterno Retorno e o Conhecimento Iniciático.
. Círculo: É o símbolo da Psique. Platão descreveu a psique como uma esfera. Está presente nos cultos da Lua, do Sol, nas mandalas, mitos e sonhos. Representa a unidade, a perfeição humana. (JUNG, 2008, pág. 324). As mandalas estão presentes no Oriente e também no Cristianismo (Rosáceas das catedrais). O círculo também aparece nas pinturas rupestres, no período neolítico.
. Quadrado: e também o retângulo é símbolo da matéria terrestre, do corpo, da realidade. (JUNG, 2008, pág. 324).
. Triângulos: Dois triângulos que se interpenetram, um apontando para cima, o outro para baixo, simbolizam a união de Shiva e Shakti, as divindades masculina e feminina. Simbolizam a união dos opostos, a união do mundo temporal (ego) e atemporal (não-ego). É a união da alma com Deus.

Texto de Osvaldo Olavo Ortiz Solera - Ygbere

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